terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

sábado, 29 de outubro de 2022

Compromisso com o Estado de Direito e integridade de caráter


Nesta véspera de segundo turno das eleições presidenciais no Brasil, reafirmo o que manifestei por ocasião da primeira rodada do sufrágio, no sentido de cerrar fileiras da frente ampla contra o autoritarismo e o obscurantismo, representada, circunstancialmente, pela candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que reúne, em expressiva coligação, nada menos que 10 partidos políticos e incontáveis apoios nos mais esclarecidos 
segmentos — à esquerda, ao centro e à direita  dos meios político, econômico, cultural e acadêmico nacionais. 

Anoto ainda, por oportuno: Em especial de quem tem formação jurídica, nomeadamente aquela haurida em universidade pública, espera-se que adote, neste crucial momento da vida nacional, postura de mínimo compromisso com o Estado de Direito e com a própria alma mater, não apenas como ato de rejeição ao autoritarismo e ao obscurantismo, mas também, inevitavelmente, como inequívoca demonstração de integridade de caráter. 

Tenho dito. 






Leia também:
https://bit.ly/3Nn9Ysv

 


sábado, 1 de outubro de 2022

Pela frente ampla contra o autoritarismo e o obscurantismo


Em pelo menos duas ocasiões passadas votei em Ciro Gomes, que ora concorre pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, para presidente da República. Parece-me ele ainda hoje, de forma inequívoca, o candidato tecnicamente mais bem preparado para o exercício do cargo e que apresenta o mais detalhado e consistente programa de governo — programa esse, aliás, quase que inteiramente alinhado com minha visão a respeito do papel do Estado e do bom governo no mundo contemporâneo. É com pesar, pois, que deixo de sufragar seu nome nas eleições deste ano de 2022.

As razões de tal decisão, conforme venho sinalizando nos últimos tempos a meus interlocutores, residem, basicamente, nos seguintes elementos que entre si por desventura se conjugam: o crítico momento político-institucional que atravessa o País, cujas instituições democráticas vêm sendo postas seguidamente à prova ao longo dos últimos anos, ao lado da incapacidade de Ciro Gomes de demonstrar compreensão bastante do momento histórico que vivemos e cerrar fileiras — como têm feito muitos, à esquerda e à direita no espectro ideológico — de uma frente ampla em defesa do Estado de Direito, submetido a crescentes desafios pela malta autoritária e obscurantista ora instalada no poder. 

E é, pois, em favor de tal frente ampla, circunstancialmente representada pela candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores - PT, que — na real expectativa de que a derrota das facções de extrema-direita se possa dar prontamente, em turno eleitoral único — consignarei meu voto neste 2 de outubro.

Fica, aos que me lêem, a exortação a acompanhar-me nesta sensata e realista escolha. 






quinta-feira, 24 de junho de 2021

No natalício de J. B. Villela, uma crônica e uma entrevista


Por ocasião da passagem de mais um natalício do Prof. João Baptista Villela, o Blog do Braga da Rocha torna a lembrar uma inspirada crônica e u'a memorável entrevista concedida pelo grande mestre, publicadas por ex-alunos que lhe seguiram a vocação para o magistério jurídico, no campo do Direito Privado.

Ao Prof. Villela, nossos cumprimentos pelos 85 anos de vida.









sexta-feira, 11 de junho de 2021

Arnaldo




"Não é só pela dor que a morte nos desconcerta.
Na sua carga de enigma e mistério, espelha-se muito,
ou mesmo o mais, de nossa impotência diante do destino,
de nossa insegurança quanto ao futuro e de
nossa angústia frente ao desconhecido."
João Baptista Villela


Há exatamente um ano eu me via a contragosto despertado, logo cedo, para o que parecia tratar-se de um genuíno pesadelo: a notícia do inesperado e abrupto passamento do professor, advogado e editor Arnaldo Oliveira Jr., meu querido amigo ao longo de décadas. 

O estado de perplexidade e dor em que me pus imediata e duradouramente imerso frustraram o propósito de escrever-lhe, então, uma substancial e merecida nota obituária – que agora, talvez, já não faça maior sentido.

Restam, entrementes, as vivas saudades do fraterno amigo que conquistara já nos derradeiros anos de adolescência e que viria a se tornar, com o passar dos tempos, notável colega de ofícios jurídicos e acadêmicos, habitual companheiro de hobbies variados e dileto 'afilhado' de casamento.

Com ele costumava compartilhar desde periódicos encontros em tardes de sábado para a indefectível feijoada no Minas Tênis Clube, com animadas prosas sobre direito, política e costumes, a longas noites e madrugadas adentro de intensa reflexão sobre a existência, entremeadas de libações etílicas e tabagísticas, no recesso de casa, em que se delineavam ambiciosos projetos pessoais e profissionais para o porvir.

Não quis o destino que déssemos andamento àquela projetada publicação de uma coletânea de trabalhos de Villela, ou que concretizássemos uma acalentada viagem em recíproca companhia a Napa Valley, ou ainda que continuássemos nossas prazerosas incursões gastronômicas a bordo de Jeep & Harley Davidson pelo interior de Minas.

Mas, para algum consolo meu, esse mesmo destino, tão pungente quanto equívoco e incompreensível, foi o que me proporcionou o privilégio de ter convivido fraternal e intensamente com uma das figuras humanas mais singulares e admiráveis, por seus múltiplos talentos e incontáveis virtudes, que nossa geração conheceu. 

Salve, Arnaldo!



quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Grupo de Estudos em Fundamentos de Teoria Geral do Direito: Minicurso em Teoria do Direito




O Grupo de Estudos em Fundamentos de Teoria Geral do Direito - FTGD convida toda a comunidade acadêmica e demais interessados a participar do Minicurso em Teoria do Direito, em que serão abordados os pilares do pensamento dos principais autores estudados ao longo do último semestre.

Os encontros ocorrerão entre os dias 8, 9 e 10 de fevereiro, às 11h20min. A duração de cada módulo será de 1 hora, sendo 45 minutos de exposição e 15 abertos para debate.

Para aqueles que desejarem certificado, as inscrições podem ser feitas com a ferramenta forms:
https://forms.office.com/Pages/ResponsePage.aspx?id=OWESZFJD10yx-yqXHG9ppkS82fHgkPtFhwESkScZ6SZUMU42QTZEVUI4UVdWWldXRFZVWTBPRklNVS4u

A sala de reuniões estará acessível por meio do seguinte atalho:

https://meet.google.com/ikg-xpch-aoi
 





sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

10 anos





O Blog do Braga da Rocha completa, neste início de 2021, seus 10 anos de atividade na plataforma 
Blogspot, da rede Google, com mais de 152 mil acessos ao longo do tempo. 

A todos os que, das mais diversas formas, contribuíram e vêm contribuindo para esta realização, o agradecimento do editor.

Leia-se, por meio do atalho contido na imagem infra, a íntegra da mensagem de sua 'reinaguração' neste sítio.  













quinta-feira, 15 de outubro de 2020

150 mil acessos

Em quase 10 anos nesta plataforma, o Blog do Braga da Rocha ultrapassa a marca de 150 mil acessos.




segunda-feira, 22 de junho de 2020

Dois anos sem Waldir Pires



Contam-se hoje dois anos de saudades de
Waldir Pires, eminente mestre e incontestável líder,
além de
genuíno estadista e extraordinária figura humana,
a quem tive a suma honra de coadjuvar ao longo do tempo
em que servi à Controladoria-Geral da União, em Brasília,
como consultor jurí1dico do então ministro de Estado.


terça-feira, 12 de maio de 2020

Interlagos, 80 anos


Celebra-se nesta terça-feira, 12 de maio, 80 anos da inauguração do Autódromo Internacional José Carlos Pace, em São Paulo — a.k.a. 'Autódromo de Interlagos' —, com painel elaborado pelo artista plástico Kobra, em homenagem a Ayrton Senna e sua memorável vitória, em 1991, no Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1.


https://globoesporte.globo.com/motor/formula-1/noticia/interlagos-recebe-mural-que-imortaliza-vitoria-de-ayrton-senna-em-1991.ghtml


https://exame.abril.com.br/estilo-de-vida/no-aniversario-de-interlagos-um-mural-em-homenagem-a-ayrton-senna/




domingo, 10 de maio de 2020

Reminiscências da pescaria na fazenda — excerto da obra autobiográfica 'Memórias & Reflexões', por J. Geraldo


Passo a publicar, a partir de hoje, excertos por mim cuidadosamente selecionados do livro Memórias & Reflexões, de José Geraldo Braga da Rocha. Que sirvam os recortes, aos seguidores deste blog, de aperitivo para a leitura da obra. 




Capítulo IX: Novamente, a Fazenda e coisas mais

Meu irmão mais moço, Antônio, e eu costumávamos passar as férias na Fazenda Cachoeira, depois que a mamãe se mudou com a filhada para a cidade, para estudarmos. Entre as muitas lembranças de então a da pesca de lambaris nos remansos espumosos do ribeirão, coalhados de folhas, gravetos, garranchos e o que mais a correnteza carrega, que costumavam enroscar o nosso anzol de pescador. Senão, usávamos o tanque da chácara, também piscoso, que papai construíra num plano do sopé da encosta, alimentado pela sua pequena nascente, propícia a tal a vegetação do lugar, além das águas vertentes, que desciam da serra na estação chuvosa, e que ele peixara com espécies do ribeirão. As suas águas serviam de bebedouro para o gado em pastoreio na manga, que tinha nome de pasto do Tanque ou da Chácara. No inverno e nas águas, era comum a névoa encobrir toda a encosta, cujo cafezal, da parceria com o seu Efigênio Andrade, dava-lhe um verde intenso, emoldurado pelas muitas árvores e vegetação nativas. (Então, eu ouvia o papai falar na variedade
burbom, que acho seria o plantado na chácara e nos quintais.) Aos poucos, a bruma, algo corrubiana como acontece aqui, era afugentada pelo sol. Eu gostava de ver aquilo pela manhã, da varanda da casa sede, de onde também, em época de capina e de apanha do café, acompanhava a movimentação dos trabalhadores e dos cargueiros, transportando o café para o terreiro ladrilhado da casa sede. Um pouco pra baixo do tanque f cava outra mina ou olho d'água, que nascia num lacrimal coberto de taboas, chapéu de couro, juncos e outras espécies aquáteis, que, após represada e servir de bebedouro ao gado que lá pastorava, escorria pelo valado adrede aberto.

Atravessando o quintal de canas, do lado direito da casa sede, ia o regato servir a porta da cozinha. Outro braço desaguadouro, à esquerda, ia abastecer de água a casinha de ordenha, onde ficava a queijaria e a moradia de vaqueiro casado. O estreito canal ou rego era freqüentemente limpado de folhas e entulhos mais, que teimavam obstruí-lo. Até hoje surde ali a preciosa água, embora com menor vazão. No quintal da casa sede, próximo de onde ficava a antiga bica d'água de madeira, que despejava mais de telha do precioso líquido, o Arnaldo represou-a em comportas de alvenaria, onde cria e recria tilápias. Encanada a partir dali, vai servir a casa sede. Já não há o bicame; não há água suficiente para isto. (O que será desse povaréu, com o minguamento das águas, senão, em muitos casos, sumiço das nascentes, descuidadas pelo Governo, pelos proprietários dos terrenos e diminuição das chuvas? E o calor escaldante, conseqüente ao aumento da temperatura do planeta, reconhecida pela própria ONU, faz presença inclemente, preocupante. Aliás, alguém do povo me disse, com seu jeito de entender os mistérios do tempo: Estão falando que o Sol desceu ou a Terra subiu! Se não fora estapafúrdia a idéia, seria boa versão para o grave momento, sob comando de El Niño, o tendeiro da vez! Os tempos hodiernos estão diferentes dos de meio século atrás! Eu teria uns 15 anos de idade quando li nalguma publicação do papai, lá mesmo na fazenda, da eventualidade do aquecimento do planeta. Embora as modificações climáticas ocorram muito lentamente, imperceptíveis quase, estão aí, cerca de 50 anos depois da notícia, o que nos faz conjeturar o que virá proximamente! [...]).

Voltando à pescaria de antanho, depois de horas à beira do córrego a gente levava pra casa, numa fieira, em formato de forquilha ou num encambado de embira de malvarisco, fazendo as vezes de samburá, pencas de piaus de nadadeiras raiadas de vermelho, piabinhas ou lambaris, apanhados na féria do dia – de que logo depois a boníssima Maria Domingas preparava para nós saborosas fritadas, empanadas em fubá. A gente não se contentava de comer um, dois ou três peixinhos, mas sim quantos perdurassem na travessa. A gula pedia mais e mais crocantes petiscos, tão bem passados pela boa cozinheira.

Até o papai e os vaqueiros iam pescar mandis e traíras, à noite, quando as chuvas de final de primavera ou já em curso o verão faziam o ribeirão subir vezes sem conta e derramar-se sobre as margens, inundando as largas e extensas vazantes de arroz, que fecundava, cultivadas pelo seu Efigênio Andrade, em parceria com o papai. (Só depois eu tomaria conhecimento dos campos de arroz de sequeiro, que fazem a riqueza do pampa gaúcho, que a gente nem imaginava existir, conhecedor que era apenas do de alagados. Quando vejo rizicultores trabalhando em vazantes, com água até os joelhos, lembro-me do seu Efigênio Andrade, as calças dobradas, plantando ou ceifando o cereal nas vazantes da fazenda, à semelhança china.) Então, ao amanhecer depois de noites de muita chuva de verão, o que era freqüente, eu corria à borda do terreiro da cozinha, para ver o ribeirão cheiíssimo, transbordante. De lá gostava de ver a vazante inundada de água turva, encobrindo a vegetação – que, depois, ao baixar, deixava sedimentos que a fertilizavam e propiciavam ubérrima produção do cereal. (Mais tarde, compreenderia a observação do historiador grego Heródoto, de que O Egito é uma dádiva do Nilo.) Dizia-se que esses peixes maiores, a cuja pesca íamos nessas ocasiões, só se aproximavam do anzol com a água avolumada e suja da terra levada pela torrente à calha do ribeirão. Então, à noite, a gente ia com os adultos à pescaria, sentindo-nos os tais à beira do ribeirão, fora de horas (que porém nem tão tarde era, senão para nós criançolas!). Às vezes, a aventura nos levava, com papai e serviçais, até a represa da usina, aquele mundão d'água piscosa, como nos parecia, que também atraía pescadores de derredor e até da cidade, munidos de caniços longos, que, mais do que os nossos, alcançavam longa distância da margem. Porém, ainda não havia molinetes nesse mundinho tacanho. Antecedia a pescaria a azáfama do preparo de varas de anzóis encastoados em trançados de arame, para proteger a linha da serrilha dos peixes, os lastros de chumbo para fazê-los afundar n'água, e as minhocas, que, apanhadas em locais úmidos, eram aquarteladas em samburás forrados com o húmus em que recolhidas e levadas hidratadas à beira d'água, para servir de isca. Às vezes, levávamos também a nossa matalotagem, para comermos à beira d'água, algo como piquenique que era aquilo, e aprestos para enfrentar mosquitinhos-pólvora, que vinham zunir e picar as orelhas do pescador, que, na tentativa de afugentá-los, se viam obrigados a se estapear, a praguejar e a se irritar. (Pois, não há mesmo prazer que não tenha o seu desgosto, o seu contrário, como diz a sabedoria popular!) Aí, os que eram fumantes baforavam de cigarros de fumo de rolo, como os serviçais, ou de indústria, como o papai, na tentativa de afugentar os incômodos e persistentes maruins. Senão, era fazer uma fumaceira perto, com trapos de pano, folhas secas ou úmidas, sabugo de milho e não sei o que mais, de combustão lenta, à falta dos modernos repelentes. Cada pescador adulto quase sempre pescava pelos menos uns dois ou mais peixes graúdos, o que já era motivo de festa. Porém, qualquer de nós que apanhássemos mais peixes do que os outros, pequenos ou grandes, ouvia logo a irônica pecha quanto mais bobo, mais peixe! Antônio tinha um medo dos diabos da ferroada de traíra e mandi, donde, das raras vezes em que os fisgava, era algum adulto que os retirava do anzol. Se a pescaria não rendia logo, o papai não demorava a perder a paciência, sôfrego que sempre foi. Então, era voltarmos a casa, samburá vazio ou pouco fornido, e aguardar outra oportunidade para repetir o divertimento.

No ribeirão de casa, a gente costumava deixar o anzol ferrado n'água, na esperança de fsgar peixe taludo, como piau, traíra ou mandi, que, para nós, pescadores de lambari, era façanha e tanto. Na manhã seguinte, ansiosos para ver o resultado da empresa, corríamos ao local. Se constatávamos que a vara, ao ser movimentada para trás, se curvava em arco com o peso da presa fisgada, era rir de orelha a orelha e coletá-la, com cuidado, senão levar o pescado suspenso no anzol, exibindo-o, para logo ser consumido no almoço. A mamãe tinha um medo sem igual das espinhas desses peixes maiores, como a traíra, além do piau, que tem a espinha em forma de ípsilons (yy) entranhada na carne, o que não deixava de nos contagiar. Certa vez, a vara arqueada trouxe baita surpresa: o apresado era um pequeno cágado, que o povo chama de sapo-concho! Deu um trabalhão danado livrá-lo do anzol e devolvê-lo à corrente d'água, ante a sua insistência de recolher o longo pescoço, com anzol e tudo, às entranhas sob a carapaça. Vai, quelônio, vai!, foi afinal a nossa palavra de ordem ao vagaroso réptil, que então se meteu n'água de novo, naquele nado cachorrinho. Melhor tivesse o anzol se enroscado nos juncos que margeiam o corgo, do que aquilo. Mas valeu a curiosidade de fisgar bicho tão diferente, parente, parece, do jabuti e da própria tartaruga, de maior porte, que, claro, inexiste por aqui.

Os rebojos piscosos do ribeirão Jambeiro – formado pelo vertedouro da represa da usina –, que passa pela fazenda, eram também propícios à nossa natação incipiente. A gente pulava da ponte num desses redemoinhos d'água, onde a água quase não dava pé. Dávamos as nossas braçadas e pernadas, com o que logo alcançávamos vau, pouco extenso que era o fojo do pequeno curso. Engraçado: há pouco tempo estive no local com o irmão desses folguedos. O local, diferente, o ribeirão, acanhado, quase rasoura ou varador só, a ponte não está no mesmo lugar, foi arredada um tantinho pra baixo donde ficava, nem tem a altura de antes, quando a água das cheias chegava quase a cobri-la e torná-la ponte afogada; agora, parece de menor caudal. Ou seria porque, como ressabido, demuda a dimensão do mundo entre a visão da criança e a do adulto? Porém, perto dali, no início da cerca de arame farpado, varando espigão, na confrontação do pasto do Borges com o da cozinha, como cógnitos esses pastios, continua de pé o mourão de braúna, de ponta chanfrada, pra não juntar água de chuva. Braças de rodo o cujo, já desbotado o negro da madeira, dando mostra das mazelas do tempo. Fora fincado como mourão da então recém-confeccionada cerca de arame farpado, de quatro fios, tesos que nem corda de violão – por certo, arte do seu Luis Pires. Tão parrudo o madeiro, que nem careceu de estronca para firmá-lo chão adentro, para não se mover com a torção do aramado. Serviria ainda, a partir daí, para demarcar o tempo vindouro! A mando do papai, cravei-lhe a formão a data, já bosqueja, de 19 de julho de 1963. O então quase-cunhado Otacílio Marilac, vindo da Fazenda Marinheiro, onde tinha naco de terras, com destino à cidade para noivar minha irmã (com quem se casaria em 21 de dezembro seguinte), ficou escarranchado e fumando por meia hora ou mais à sela do cavalo ajaezado, sobre a ponte, olhando ali perto o meu labor de entalhador das dúzias (expressão da mamãe, para designar algo pouco valioso), para depois, concluída a datação do grosso tronco, seguirmos em conversê a penates. Faz pois meio século – e lá vai pedra! – o episódio.
[...]

sábado, 2 de maio de 2020

Vai-se Nirlando Beirão, um expoente do jornalismo e da 'intelligentsia' brasileira


Diz Sergio Lino, redator-chefe da revista CartaCapital — secundando, salvo engano, o próprio Mino Carta —, que ler os textos do jornalista e escritor mineiro Nirlando Beirão é "como ouvir uma sinfonia".

Cessaram anteontem, num melancólico fim de abril de 2020, suas magistrais composições. O jornalismo e a intelligentsia brasileira perdem um de seus grandes expoentes, aos 71 anos de idade, vítima de doença degenerativa de que padecia já há algum tempo.

Ao elegantíssimo maestro, minhas homenagens.



Nirlando Beirão, 1948-2020



Em tempo:
Leia-se aqui no Blog do Braga da Rocha memorável artigo de Nirlando Beirão, originalmente publicado em 2013 no Portal R7 e depois dali suprimido, sobre tema de significativa expressão na atualidade, à vista dos sestros comuns ao tragicômico trio Jânio Quadros, Joaquim Barbosa e Jair Bolosonaro.





quinta-feira, 30 de abril de 2020

segunda-feira, 27 de abril de 2020

A propósito da arte de produzir prefácios

Receita de prefácio ou orelha de livros
por
Jorge Fernando dos Santos

"o verdadeiro prefaciador ou orelhista deve ser de natureza pusilânime, o tipo que morde e sopra ao mesmo tempo – barata kafkiana –, sendo incapaz de reconhecer a própria incapacidade de dizer que o texto alheio é uma obra-prima ou covarde o bastante para não afirmar que se trata apenas de uma indigesta sopa de letrinhas sem o devido tempero estético."


https://domtotal.com/artigo/4020/26/12/receita-de-prefacio-ou-orelha-de-livros/





sexta-feira, 17 de abril de 2020

Prefácio à recém-publicada obra 'Memórias & Reflexões', de J. Geraldo



https://bragadarocha.blogspot.com/2020/04/memorias-e-reflexoes.html


Recebi de meu caríssimo tio J. Geraldo — a quem, conforme cediço, sempre prestei a devoção que se rende a um pai — a incumbência, tão honrosa quanto árdua e desafiadora, de compor o prefácio desta substanciosa obra, com que traz ele a lume suas Memórias & Reflexões, produzidas e recolhidas ao longo dos mais de 70 anos de vida. 

Não poderia cultivar a pretensão de entabular, em breve e modesto escrito como este, um autêntico diálogo com a vasta extensão e pluralidade de lembranças e idéias contidas no livro, assentadas sobre um amplo, rico e não raro erudito universo de interesses, que vão da experiência da vida interiorana e rústica à ciência e à cosmologia, das tradições culinárias à filosofia, das manifestações da linguagem à política, da sétima arte à poesia, do folclore regional à onomástica e à toponímica, do conhecimento jurídico à teologia, da literatura universal à história. 

De muitos desses interesses, aliás, ensinou-me o autor a compartilhar, em meio a divagantes prosas e deleitáveis tertúlias que, desde ao menos minha adolescência, de tempos em tempos costumamos ter, a varar a madrugada — no intimista e acolhedor espaço da cozinha de sua casa ou no instigante ambiente de sua valiosa biblioteca, que sempre freqüentei —, quase invariavelmente regadas a um saboroso café ou a inspiradores beberes outros. 

Vejo consignar-se, dessarte, no longo e denso texto ora publicado — ad perpetuam memoriam, pois conforme preceitua o velho adágio: scripta manent! —, muito do fértil e imensurável saber do autor, de que um naco pude haurir em longo aprendizado, assim como profusas notas, referências e libações à gloriosa, conquanto por vezes dura e penosa, trajetória pessoal, familiar e social de muitos coetâneos seus e de tantos antepassados nossos em comum, cingidos todos pelas relações de amizade ou por linhagem de estirpe. 

A mim, porém, cumpre e importa salientar, sobretudo e com preeminência, para tento do leitor que por estas páginas decida se aventurar, o belo, precioso e fecundo registro, que a obra congrega e nos convida a degustar, da magnífica realidade da vida quotidiana em um peculiar rincão das Minas Gerais, nomeadamente ao longo de meados do século XX, com seus personagens, seus modos, seus códigos, seu linguajar, seus usos e costumes, suas tradições — uma realidade escassamente ou nada conhecida pelas subseqüentes gerações, até porque a pouco e pouco dissipada ou mesmo já extinta com o advento do complexo e multifário modus vivendi contemporâneo. 

Eis, pois, o tipo de obra que, embora perpasse com nitidez o gênero autobiográfico, a ele não se confina — antes, está a representar, estreme de qualquer dúvida, valioso acervo de elaborados registros, via recordações e reminiscências várias, concernentes a um tempo e a um lugar da non perdersi na memória coletiva do porvir —, e que se destina a ocupar, em nossa biblioteca, aquele singular e nobre espaço no qual se situam livros que não apenas desejaríamos ter escrito, em possuindo talento e determinação bastantes para tanto, mas, sobretudo, cujas passagens e histórias gostaríamos de ter o privilégio de haver testemunhado e vivido.

Belo Horizonte, janeiro de 2020
Renato Amaral Braga da Rocha



quarta-feira, 15 de abril de 2020

'Memórias & Reflexões', por José Geraldo Braga da Rocha


É com grande satisfação que faço saber a familiares e amigos, e a quem mais interessar possa, que acabam de sair do prelo os primeiros exemplares da obra Memórias & Reflexões, de autoria de meu caríssimo tio, peçanhense de escol e magistrado José Geraldo Braga da Rocha — cujo prefácio tive a honra de escrever e cuja edição, do design à materialização do corpus mechanicum, foi cuidada com extraordinário esmero pela escritora, artista plástica e produtora cultural Dôra Borges. 

Em breve, pois, conforme já anunciado, haverá a obra de ser encontrada em algumas das mais prestigiosas bibliotecas públicas e privadas de Santo Antônio do Descoberto do Peçanha, das Minas Gerais e do País.


Prefácio à obra, por
Renato Amaral Braga da Rocha





terça-feira, 7 de abril de 2020

Entrevista ao sítio eletrônico do grupo FCA


Publico, a seguir, íntegra da entrevista que concedi ao jornalista Leandro Álvares, a serviço do sítio eletrônico institucional do fabricante dos veículos Jeep, o grupo Fiat Chrysler Automobiles - FCA, nesta ocasião em que se celebram cinco anos do lançamento do Jeep Renegade no Brasil. 




FCA: Como começou sua história com o Jeep Renegade? 

Sempre tive o desejo de adquirir um veículo da marca Jeep. Posso dizer que cresci andando de Jeep. Na família, em quatro gerações, desde o bisavô, passando pelo avô e pelo pai, além de tios e primos, já havíamos sido proprietários de alguns dos clássicos Jeep Willys e Jeep Ford, da série CJ, ao lado de outros modelos célebres na história da marca. 

Em 2016, quando perdi meu Ford EcoSport XLT 2.0 AT em um acidente de trânsito, o Jeep Renegade acabara de ser lançado no Brasil. Não demorei a chegar à conclusão de que o novo SUV compacto seria o próximo veículo a me atender: versatilidade, alta tecnologia, design icônico, marca de tradição e prestígio, produção nacional e custo razoável tanto de aquisição como de manutenção, entre outros atributos. 

Li publicações da imprensa especializada, visitei concessionárias, conheci o veículo em detalhes e fiz test drive nas versões com motor bicombustível e a diesel. Acabei optando por um Jeep Renegade Longitude 1.8 flex AT6 4x2, modelo 2016, que me viria a proporcionar as primeiras boas experiências com o carro. 


FCA: O que mais te agrada no SUV? 

O Jeep Renegade, especialmente em suas versões equipadas com tração integral — como o Trailhawk 2.0 turbodiesel AT9 4x4, modelo 2018, que hoje possuo —, parece-me ser o veículo, em sua faixa de mercado, que melhor conjuga o perfil de uso urbano com a aptidão off-road. E isso já seria o suficiente para justificar plenamente minha opção pelo carro. 

Além disso, o Renegade traz consigo o prestígio histórico da marca Jeep, um design retrô único e personalíssimo, acabamento esmerado e muita tecnologia embarcada, além de, no caso dos 4x4 turbodiesel, sistema de câmbio e tração altamente avançado e motor com considerável potência e excelente curva de torque. 


FCA: Alguma história marcante com o seu Renegade? Uma viagem, por exemplo… 

Assim que comprei meu primeiro Jeep Renegade, na versão Longitude 4x2 flex, passei a fazer pequenas incursões em ambientes fora-de-estrada, organizadas pela própria Jeep, por suas concessionárias ou por grupos independentes de praticantes do off-road. O costume se intensificou com a aquisição do Trailhawk 4x4 turbodiesel, que me permitiu buscar aventuras de maior grau de complexidade. 

Certa feita, ao realizar um percurso de considerável dificuldade, acompanhado de um instrutor com larga experiência e profundo conhecimento do Renegade — no caso, o conhecido Clecio William, diretor da CWS Eventos Automobilísticos, em Brumadinho, MG  comentei com ele que havia acabado de passar com surpreendente desenvoltura por um obstáculo que veículos mais robustos à minha frente, como o Troller T4 e até mesmo um antigo Jeep Wrangler, mostraram certa dificuldade para transpor. A resposta dele foi memorável, seja pelo bom humor, seja por traduzir com perfeição a inteligência dos sistemas eletrônicos à disposição no Jeep Renegade para a superação desses obstáculos no off-road: “Não sei se foi mesmo você que passou por aquela vala... Ou se foi o Renegade que passou por ela pra você!” 


FCA: Você já está no segundo. Mas teria outro Renegade? 

Minha experiência inicial com o Jeep Renegade foi tão boa que optei por outro Renegade na ocasião da troca — como disse, de um Longitude 4x2 flex, modelo 2016, na cor Vermelho Colorado, para um Trailhawk 4x4 turbodiesel, modelo 2018, na cor Branco Polar —, que costumo fazer aproximadamente a cada 3 anos. E, satisfeito que me encontro com o carro, na próxima troca seguirei considerando o Renegade como opção preferencial. 

Só espero que, até então, a Jeep já tenha decidido incorporar no Renegade recursos de tecnologia presentes, por exemplo, no Compass — tais como alerta de ponto cego, frenagem automática de emergência, piloto automático adaptativo etc. —, além de restaurar itens injustificadamente eliminados, como tomada de 12v traseira, rebatimento elétrico dos retrovisores e suspensão diferenciada para a versão Trailhawk, entre outros. 

Apenas em caso de não haver a necessária evolução tecnológica no Jeep Renegade eu passaria a considerar outros modelos ou marcas, por ocasião da troca do meu atual veículo. 


FCA: Na sua opinião, o que faz o Renegade se destacar entre os outros SUV? 

Sou da opinião de que o Jeep Renegade, especialmente em suas versões 4x4 turbodiesel, na prática não tem concorrentes no mercado brasileiro. Um SUV compacto, com motor diesel de 170cv e cerca de 35kgfm de torque e ainda câmbio seqüencial de 9 marchas, conjugados com toda a tradição e a expertise off-road da marca Jeep, praticamente inexiste nessa faixa de mercado. 

Quanto ao Renegade nas versões 4x2 flex, posicionado em patamar no qual a concorrência é mais acirrada, penso que diferenciais como o design inconfundível, o acabamento primoroso e o bom nível de tecnologia embarcada — itens como freio de estacionamento elétrico, freio a disco nas quatro rodas e suspensão multilink traseira, além de recursos como controle de estabilidade e controle de tração de concepção avançada — constituem diferenciais inequívocos em relação às outras opções de SUV compacto 4x2 existentes no mercado.



domingo, 5 de abril de 2020

Cinco anos do lançamento do Jeep Renegade no Brasil


Compartilho, infra, atalho para artigo de autoria do jornalista Leandro Álvares, publicado no sítio eletrônico do grupo Fiat Chrysler Automobiles - FCA, em alusão ao marco de cinco anos do lançamento do Jeep Renegade no Brasil.

Na condição de entusiasta da tradicional marca e proprietário, atualmente, de um Jeep Renegade Trailhawk, turbodiesel
4x4, tive a satisfação de poder contribuir para a elaboração da matéria.









terça-feira, 15 de outubro de 2019

15 de Outubro: Mais um dia como outro qualquer


Quando, há décadas, tive despertado o interesse pela vida acadêmica, sob a inspiração de meu querido mestre João Baptista Villela, acreditava poder chegar a ver, no horizonte de tempo de minha vida profissional, uma substancial alteração do desolador estado de coisas que já então se configurava na universidade brasileira.

Desde então, entrementes — embora se deva reconhecer a existência de avanços pontuais, sobretudo ao longo da primeira década do séc. XXI —, pouca coisa mudou. A atenção à educação em geral, e à universidade em particular, continua viva na retórica, mas ausente das ações prioritárias de governo, seja qual for o governo, nas diferentes esferas da Federação, até porque jamais representou um efetivo reclamo da sociedade.

As condições de trabalho e a remuneração dos professores seguem precárias e mesmo vexatórias, sobretudo se comparadas às de inúmeras carreiras públicas que requerem, consideravelmente, menor qualificação e menos acentuada dedicação.

A posição e o papel institucional da universidade resultam cada vez mais aviltados, por todos os meios, nomeadamente os seguidos e fatais atentados cometidos contra a autonomia constitucionalmente prevista.

O País
leia-se: a sociedade brasileira parece, decididamente, não se importar com a educação, de modo geral, muito menos com uma educação superior de excelência, nem se dar conta dos inequívocos benefícios sociais dela decorrentes.

Depois de ter lecionado em algumas das mais prestigiadas universidades públicas brasileiras — e de ter também experimentado, pari passu, as agruras de funcionar como agente de produção no vergonhoso sistema privado de ensino superior que erigimos —, sem embargo de ter ainda atuado em instâncias superiores do Ministério da Educação, curvei-me à triste limitação de perspectivas profissionais do trabalho acadêmico e venho, a pouco e pouco, renunciando à atividade docente.

Em mais este Dia dos Professores, pois, ocorre-me nada a comemorar ou pôr em relevo, salvo, talvez, a singular conjugação de fé e realismo que se pode extrair de uma tão candente quanto contundente manifestação como a que transcrevo a seguir, feita há certo tempo por um dileto colega que acabara de assumir o cargo de professor na universidade pública:

 

"Ontem fui tomar posse como Professor Adjunto da UFMG. Após uma hora de espera em uma sala escaldante (a sensação térmica era certamente de 40 graus ou mais), assinei dois papeis e, assim, quase sem me dar conta (provavelmente por causa do calor), tinha sido investido em um dos cargos mais importantes da nação. Meus amigos juízes, promotores e procuradores teriam ficado decepcionadíssimos com a simplicidade do ato, com a ausência de discursos de exortação à carreira e congratulações pelo esforço memorável que os conduzira até ali. De minha parte, nenhum espanto. Esse é um país que menospreza os seus educadores e eu já o sabia. E não estou aqui a lamentar. O caminho que me trouxe até aqui é um caminho de reflexões e convicções muito bem sedimentadas, bem como de uma profunda consciência do meu papel e de toda a adversidade em que terei que desempenhá-lo. Desde ontem, eu sou servidor público e servirei minha nação com orgulho e empenho, mesmo que ela não se orgulhe e não se empenhe por mim." 
[o autor da manifestação é doutor em Direito, com larga produção acadêmica e experiência internacional; aqui omito sua identificação apenas por não lhe ter solicitado expressa permissão para transcrição do texto, divulgado que foi em limitado círculo de rede social]

[publicado originalmente aos 15 de outubro de 2013]










segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

Mensagem de Natal


Despojado da fé cristã, ou de qualquer outra, permito-me experimentar as festas natalinas apenas na dimensão cultural e social comum a tantos povos do mundo ocidental. 


Sequer o espírito de renascimento — aliás contido em meu nome de batismo  posso extrair da ocasião, pois isso pressuporia cultivar uma esperança que há muito abandonei.

Em especial aos que crêem e conservam a esperança, entrementes, o Blog do Braga da Rocha deseja um bom Natal.



Michelangelo Merisi da Caravaggio, Adoração dos Pastores (1609)



[originalmente publicado aos 25 dez. 2012]


sábado, 6 de outubro de 2018

Pela candidatura de Mariah Brochado



O Blog do Braga da Rocha apóia decididamente,
nestas eleições de 2018,
a candidatura da Profa. Dra. Mariah Brochado
à Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais.








sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Ad perpetuam memoriam


Neste 5 de outubro, como de costume, 
lembro o marco das quatro décadas transcorridas desde que meu saudoso pai deixou-nos precocemente, antes de completar seu trigésimo-sexto ano de vida.

Por imutáveis o sentimento e o estado de coisas, reproduzo aqui, em linhas gerais, manifestação que consignei por ocasião desta data, noutro ano, no velho Blog do Braga da Rocha. 

Nascido no berço do entrelaçamento de tradicionais famílias mineiras, radicadas na cidade de Peçanha e região, no Vale do Rio Doce, Walter Viriato da Rocha começou ainda bastante jovem a trabalhar no então Banco da Lavoura de Minas Gerais, que tempos depois viria a se transformar no Banco Real S.A., onde empreendeu bem sucedida carreira.

Passados os anos, já casado, com dois filhos ainda em primeira e segunda infância, e graduado em Direito, recebeu da instituição financeira a que servia a incumbência de assumir o posto de gerente-geral de agência situada na cidade de São João Evangelista, MG  localidade já então tristemente conhecida por longo histórico de violência e banditismo, patrocinados nomeadamente por uma família de criminosos que detém o poder político e econômico local.

Investido no cargo, não tardou, porém, para que o recém-chegado gerente, cioso de cumprir fielmente suas atribuições funcionais, deixasse de atender aos desmandos habituais da súcia que se fazia hegemônica naquelas plagas. E não tardou perecer, por conseguinte, cruelmente executado a tiros por seus clientes na varanda de casa, de surpresa e diante dos olhos estarrecidos de sua família.

Padeceu, assim, como mártir da própria boa-fé, do inflexível rigor ético de suas ações, do profundo sentimento de dever e de responsabilidade que norteava sua vida pessoal e profissional.

Colheram-no e a sua família a incivilidade, a ignorância, a covardia, a truculência, a vilania e a barbárie de uns facínoras cujo poder se exerce, há décadas, sob o signo da intimidação, da violência e do terror —, seguidas da insensibilidade, da indiferença, da desonestidade, da mesquinhez, do oportunismo e da cupidez de outros, cujo métier consiste basicamente em locupletar-se à custa da desgraça e da miséria alheias, senão, até mesmo literalmente, do sangue de seus semelhantes.

Os facínoras e sua amaldiçoada estirpe hoje se encontram confortavelmente assentados em cômodos homesteads, prodigiosos fundos de comércio e valiosas estâncias rurais, depois de experimentar não mais que ligeiramente o sofrimento do cárcere, que por merecimento não haveria de ser menos duradouro que o restante de sua abjeta existência.


É o que resultou da combinação de considerável poderio político e econômico, capaz de em seu favor pôr a soldo advogados de grande renome e escasso senso ético, aliado à inépcia do sistema judiciário em cumprir seu elementar mister de realizar a justiça.

Entre os demais atores envolvidos na trágica história, é não muito diversa a ventura de que todos compartilham.

Há os agora ex-banqueiros, argentários e sanguessugas, a desfrutar da fortuna multibilionária acumulada por todos os meios imagináveis, o que permite a descendentes seus, prósperos e faceiros, dar-se a extravagâncias tais como se dedicar a competições internacionais de automobilismo e quejandos.


Há também a malta de causídicos pulhas e velhacos, a gozar da opulência e do prestígio que lhe conferem os sabujos do mundo jurídico, no comando de portentosas empresas de advocacia especializadas na pantanosa atividade de lobby junto ao Poder Judiciário, desenvolvida à sombra de escusas e promíscuas, senão genuinamente criminosas, relações com integrantes de tribunais.

E há, por derradeiro, pelo menos um expoente da quadrilha de meliantes travestidos de magistrados  ora ditos, por integrante do próprio Poder Judiciário, em raro arroubo de sinceridade e decência, "bandidos escondidos atrás da toga" , altamente sensível aos referidos lobbies, que hoje se encontra a fruir nababesca aposentadoria custeada pelo contribuinte brasileiro, depois de ver frustrada sua candidatura a uma cadeira no Supremo Tribunal Federal ante denúncia da prática de venda de decisões, enquanto ministro do Superior Tribunal de Justiça.

Funesto, afinal, apenas o destino daquele jovem pai de família  cuja trajetória profissional o levara a assumir posto de dirigente bancário num longínquo rincão das Minas Gerais, onde com zelo defendia os interesses de seu indiferente empregador, quando, desafortunadamente, cruzou-lhe o caminho uma quadrilha em forma de celerada parentela.

Fulminou-se assim não apenas a vida de um grande homem, mas também, com decorrentes e sucessivas iniqüidades tamanhas, todas as crenças e esperanças dos destinatários de seu legado de retidão e honradez.

 


Adv. Walter Viriato da Rocha
1942-1978




[texto, ora com achegas, originalmente publicado
aos 5 de outubro de 2011]